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“Devolvam o Maracanã”, pedem os brasileiros nas ruas

O governo estuda a criação de ingressos baratos para a Copa

Juan Arias
El estadio de Maracaná, en Río de Janeiro.
El estadio de Maracaná, en Río de Janeiro.ALEXANDRE LOUREIRO (AFP)

“Devolvam o Maracanã”, dizia um cartaz nas mãos dos manifestantes que se enfrentaram com a polícia durante a partida Brasil-Espanha no domingo passado.

O estádio do Rio é lindo, mas já não é da gente, “do povo”, dizem os que manifestantes. A sua reforma custou 600 milhões de dólares, o dobro do previsto, e um consórcio privado vai administrá-lo por 35 anos.

O velho e mítico Maracanã era dos cariocas, sem distinções. Como nos teatros, nele havia uma área a preços populares chamada “geral”, e até os mais pobres o consideravam seu.

Mas a “geral” já não existe e, como comentava Ancelmo Gois na sua famosa coluna de O Globo, “Ontem, no Maracanã, como está acontecendo em outros estádios da Copa, era raro encontrar negros, e provavelmente pobres, entre o público.” E acrescentou: “Havia senhoras de salto alto e bolsa da marca americana Michael Kors.”

A crítica ao elitismo dos novos estádios que estão sendo construídos para a Copa não vem só dos que gritam nas ruas, mas até do Palácio Presidencial. Dilma Rousseff comentou com os seus ministros: “Não vi nenhum negro no estádio de Salvador”, cidade onde 80% da população, e talvez mais, é negra.

Rousseff alertou que isso “não pode acontecer na Copa” do ano que vem. Para tal, o governo está estudando – embora a FIFA não esteja muito de acordo – criar ingressos baratos e até gratuitos para quem não pode comprá-los.

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Ontem, os ingressos para o Maracanã chegaram a custar 9.000 dólares na internet.

Alguém alertou que pode acontecer com o futebol o que já ocorreu com o samba. Festa de rua estudada e analisada por antropólogos famosos, como Roberto DaMatta, o samba acabou confinado no sambódromo, santuário para turistas e gente rica que deixou de fora os que o criaram e conceberam.

A vingança dos cariocas contra o samba limitado ao sambódromo foi voltar a encher as ruas da cidade de blocos, onde gente de todas as categorias sociais se mistura numa explosão de música e sensualidade.

Recordo a emoção do escritor Vargas Llosa quando, com a família, quis sentir aquele calafrio dos blocos de rua e foi assistir a um em Copacabana. Depois, escreveu um dos seus melhores e mais deliciosos artigos sobre aquela experiência, que definiu como assombrosa e única.

Algo parecido pode acontecer com o futebol. Pode-se provocar a vingança dos fãs, que não querem diferenciações no esporte mais popular do país cujos melhores jogadores, a maioria negros ou pardos, vieram das favelas. Como no samba.

Tradução: Cristina Cavalcanti

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